Entrevista Exclusiva de DomíniodeBola a Domingos Paciência

1ª Parte:

Já se cansou dos trocadilhos que a imprensa fez com o apelido Paciência?

Não, nunca me canso, até porque quando existem esses trocadilhos é sinal de sucesso. Portanto, a mim não me incomoda nem me cansa.

 

Falando de futebol, comecemos pelo passado mais recente. Teve uma experiência no Deportivo da Coruña que se revelou bastante curta. O que correu mal?

Não posso dizer que correu mal. Acho que não chegou a correr nem bem nem mal porque o tempo foi curto. Se calhar, o desconhecimento do que se estava a passar no clube em termos de estrutura e condições e também a falta de reforços acabou por me levar à decisão de deixar o clube. E, também, é evidente, os resultados; as quatro derrotas consecutivas tiveram peso naquilo que foi a decisão quer da minha parte, quer do clube.

 

A passagem pelo Sporting também não correu bem, redundou em despedimento. Como analisa a sua passagem pelo Sporting?

Continuo a dizer que foi positiva. Foi positiva porque houve momentos muito bons e em pouco tempo conseguiu-se fazer uma equipa.

 

O Domingos foi demitido pouco tempo depois de ter recebido um voto de confiança de Godinho Lopes. O que sentiu nessa altura?

As pessoas são livres de tomar as suas decisões. Nesse aspecto, custa, mas as pessoas são livres de tomar as decisões que quiserem.

 

Acha que o Sporting com Bruno de Carvalho ao leme será um clube diferente para melhor?

Em termos de abordagem ao Sporting, nunca irei dizer mal porque assim o prometi. Continuo a dizer que o Sporting faz falta ao futebol português e espero que recupere o mais rápido possível e volte a ser aquela equipa a que nos habituou, sendo um dos três grandes.

 

No Sporting de Braga esteve perto de conquistar o título de campeão e mais perto ainda de conquistar um troféu europeu. O que faltou para poder festejar nesses dois momentos?

Se calhar, o peso que outras equipas têm. O Braga não tem nome internacional, o peso que tem é a nível nacional. Nesses momentos ficou à beira de conseguir ganhar, mas, acima de tudo, acho que marca um momento histórico para o futebol português. Não só para o Braga, mas para o futebol português, porque o Braga em dois anos consegue estar entre os grandes a nível nacional e internacional.

 

Que importância tem para as gentes de Braga e para António Salvador a conquista da Taça da Liga?

Muita, muita! Toda a gente sabe que o Braga ao longo destes anos tem crescido, tem sido uma equipa que se tem projectado e é natural que ao fim de um tempo se queira ganhar e traduzir isso em títulos. É evidente que é um título que deixa muita gente orgulhosa – tive oportunidade de dar os parabéns ao treinador, ao presidente e aos jogadores – e isso é um marco importante no crescimento do Braga. Agora, conhecendo eu como conheço presidente do Braga, sei perfeitamente que não é este título que ele tanto ambiciona, mas acaba por ser um título e é por aqui que se começa.

 

Crê que o Braga continuará a intrometer-se, por assim dizer, no território dos três clubes grandes?

Penso que sim. Se continuar a reforçar-se bem, acredito que o Braga vai continuar na luta. Agora, as pessoas já se aperceberam que de uma época para o outra muita coisa mudou e é natural que possa haver uma renovação. Pode-se dizer, de certa forma, que tirei algum partido daquilo que foi feito pelo Jorge Jesus, o Leonardo Jardim tirou partido daquilo que eu deixei, o Peseiro não herdou, se calhar, aquilo que outros deixaram, portanto, as dificuldades foram muito maiores este ano.

 

É de conhecimento público que o FC Porto é o clube do seu coração e disse há tempos que treinar o FC Porto seria “pagar uma dívida de gratidão”. Essa dívida poderá ser paga nos próximos tempos?

Eu disse isso no contexto de que tenho uma grande ligação ao Porto. Foi onde eu cresci, foi onde eu entrei com 13 anos e praticamente fiz toda a carreira nesse clube. Portanto, a gratidão é nesse sentido; fez de mim homem, fez de mim jogador, abriu-me portas, portanto, é natural que eu tenha que estar grato a esse clube, sentindo-o de forma diferente. Uma dívida de gratidão é sempre nesse sentido. Agora, é evidente que treinar o Futebol Clube do Porto é ambição de qualquer treinador, independentemente da ligação que possa estar para trás.

 

Como jogador e treinador, apenas actuou em Portugal e Espanha. É um objectivo mudar de ares e operar noutras ligas?

Sim, perfeitamente. Um treinador tem que estar preparado para trabalhar e ser profissional. Portanto, acho que não é uma situação que possa pôr de parte e se calhar até pode ser aquilo que possa acontecer nos próximos tempos.

 

Quando se vai sentir verdadeiramente realizado enquanto treinador?

O que realiza um treinador é a conquista de títulos, mas acho que acima de tudo o sucesso de um treinador não passa só pelos títulos. Passa às vezes por dar alegrias a muita gente, em que, por vezes, a sua satisfação não são os títulos, mas ver a sua equipa a ganhar e a sentir orgulho. Ganhar só está ao alcance de alguns e o sucesso de algumas equipas passa essencialmente por se sentirem realizadas e fazer os seus adeptos orgulhosos na equipa que têm. Há uns que estão talhados para ganhar, há uns que poderão não estar, mas, acima de tudo, um treinador procura marcar o seu currículo com títulos.

 

Considera, a médio ou longo prazo, pensar numa carreira de dirigente desportivo ou é impossível largar os relvados?

A experiência que eu tenho permite-me pensar nisso, mas neste momento não. Ser dirigente desportivo não é, de maneira alguma, um bicho de sete cabeças, até porque com anos e anos a conviver com várias estruturas e a aprender com pessoas que ao nível do dirigismo marcaram o futebol português é natural que isso a mim não me atormente se algum dia tivesse que optar por uma situação dessas.

Este ano ingressou na equipa vintage do F.C. Porto. Como tem sido essa experiência? Os quilinhos a mais dos atletas não atrapalham?

Atrapalham, atrapalham. E não só os quilos. Nós durante anos e anos gravamos muitas coisas boas e coisas que nós sabíamos fazer com velocidade e intensidade; agora, a cabeça passa essa informação ao corpo, mas ele não executa como a gente quer. Mas, de qualquer forma, é engraçado e, acima de tudo, é ter a oportunidade de voltar a conviver com colegas que marcaram o futebol português; isso é salutar e é aquilo que no fundo mais nos satisfaz em estarmos juntos uns com os outros.

 

Tem um filho, o Gonçalo, que este ano ingressará na equipa B do FC Porto. Que futuro perspectiva para o Gonçalo?

Procuro o melhor para ele, de acordo com o seu pensamento e as duas decisões. É evidente que estarei ao lado dele, a tentar com que consiga fazer o melhor caminho. Sei perfeitamente que não é fácil; tem qualidade, mas isso não basta para se tornar num grande jogador de futebol, há outros aspectos que são muito importantes e que ele os tem de trabalhar. Mas procurarei estar ao lado dele e a chamar-lhe a atenção para o que é mais importante para que se torne num jogador de futebol.

 

Tendo em conta que é treinador, é mais exigente para com o Gonçalo?

Sim, em determinados momentos sou exigente e tenho de guardar muita coisa para mim. Às vezes estou a ver jogos em que há determinadas situações que não gosto, mas tenho que as guardar para mim, até para não entristecer quem está ao meu lado com os meus comentários e com a minha análise. Sou demasiado exigente.

 

Ele é melhor ou pior jogador do que o pai? Crê que ele poderá ser um nome a ter em conta para a selecção nos próximos anos?

É diferente. A forma de jogar é diferente. Tem coisas em que é melhor do que eu, eu tinha coisas em que era melhor do que ele. Vamos ver o crescimento dele, vem aí uma fase importante na carreira, vamos ver quanto ele vai crescer. Se ele tiver capacidade e entender que pode, realmente, tornar-se um bom jogador, tem um espaço onde neste momento não há muitas soluções.

 

Portugal teve no Domingos um grande ponta-de-lança. Outros nomes recentes como João Pinto, Sá Pinto e Pauleta também se notabilizaram. Crê que actualmente há uma carência de jogadores portugueses para essa posição? O Domingos no seu auge faria falta a esta selecção?

Sim, reconheço que nesta altura quer eu, quer esses jogadores mencionados, fariam a diferença. Isto porque se analisarmos as qualidades dos avançados neste momento – por muito respeito que tenha por eles – não têm nada a ver com esses que mencionou. São jogadores mais versáteis, mais rápidos, de execução com muita facilidade, bons finalizadores de cabeça, de pé direito, de pé esquerdo, portanto, muito mais completos.

 

Como analisa a prestação de Portugal na qualificação para o Mundial? O que será um Mundial de futebol no Brasil sem a selecção portuguesa?

É triste se isso acontecer, espero que não. Espero que a gente consiga, mesmo por via do play-off, conseguir o apuramento, porque o Mundial do Brasil sem Portugal seria uma tristeza enorme. Também temos de ter consciência de que muito terá de ser feito daqui para a frente porque a nossa selecção tem deixado muito a desejar. Os resultados, é evidente, reflectem aquilo que tem sido a qualidade da equipa. Não tem sido uma qualidade superior: há selecções com menos qualidade do que nós que conseguem equilibrar o jogo e isso é uma prova de que temos de fazer muito mais.

 

2ª Parte:
Perguntas de algibeira:

 

Melhor golo da carreira… 

Contra o Feyenoord, Estádio das Antas, ao minuto 85/86.

 

Maior falhanço…

Penalty contra o Nantes, no Estádio das Antas.

 

Jogo mais inesquecível…

Um no Estádio da Luz. Ficou 2-3. Um jogo emocionante em que o resultado virou várias vezes. Começamos a ganhar, eles empataram e depois acabamos por ganhar 2-3. Acabou por ser um jogo emocionante com o estádio completamente cheio.

 

Treinador mais marcante…

Bobby Robson.

 

Jogador mais talentoso com quem partilhou o balneário…

Madjer.

 

Melhor jogador que treinou…

Boa pergunta… Tive tantos bons jogadores que trabalharam comigo. O Lima, se calhar, o Artur também, o Vandinho… O próprio Vandinho foi dos jogadores que mais me impressionaram. Foi pena que não tivesse entrado num grande mais cedo, seria um médio defensivo muito melhor que o Javi Garcia, o Matic e o Fernando, por muito respeito que tinha por eles.

 

Dirigente mais competente que conheceu…

É um presidente que funciona em toda a dimensão, acho Pinto da Costa incomparável por tudo o que fez pelo Porto e pelo futebol português.

 

Defesa mais ‘caceteiro’ que defrontou…

Lembro-me na minha fase inicial do Vasco, do Penafiel, depois o próprio Mozer, do Benfica, que não era propriamente caceteiro, mas era muito agressivo, e o de Wolf, do Feyenoord.

 

Melhor momento pela selecção…

A presença no Europeu de 1996. Passados 30 anos, Portugal volta a estar numa competição em que estivemos bem, fomos infelizes, mas representamos bem Portugal e começamos aí a marcar a diferença.

 

Melhor jogador da actualidade…

Há que eleger um português e acho que o João Moutinho neste momento é aquele jogador que marca a diferença. Noutro patamar, acho que o Cristiano Ronaldo vai ficar na história do futebol mundial.

 

Superstição antes de entrar em campo…

Não tenho. Antes benzia-me, mas entretanto deixei de o fazer.

 

Episódio mais caricato…

Tenho tantas situações no futebol, que acabam por ser de riso, de tristeza e é difícil estar a mencionar algum.

 

Maior desilusão no futebol…

As lesões são as maiores desilusões. É um sentimento de impotência…

 

Sonho por cumprir…

Muitos, muitos… Porque ainda acredito que muita coisa de bom vai acontecer e muita coisa se vai concretizar dentro daquilo que eu perspectivo.

 

Conselho mais útil que recebeu…

Acho que tenho recebido muitos conselhos, mas a experiência que tenho vivido acaba por ser uma grande lição de vida e apoio-me naquilo que acontece e ajuda-me a resolver muitas situações.

 

Sexo antes dos jogos…

Não sou contra, mas depende se é na véspera ou na antevéspera…

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