Da selecção, nem bom Bento nem bom casamento
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Escrito por: Cláudio Moreira
Eu já não nutria especial amabilidade pelo seleccionador nacional. Este triste episódio ocorrido no Gabão veio apenas acentuar a minha antipatia por ele. É que dá a sensação de que o trabalho dele é imune à crítica; de que quem ousa tecer uma consideração negativa é um antipatriota e um acéfalo que festeja as vitórias das equipas que defrontam Portugal ou um colombiano de gema.
Paulo Bento há-de ser um eterno perseguido. Uma vítima de tudo e de todos. O “sistema” está contra ele e impede-o de ganhar. Em quatro temporadas ao serviço do Sporting, ficou sempre em segundo lugar. Devido às arbitragens, claro. Ou à eterna “mão do Ronny”. Apesar da lengalenga do costume, o que Paulo Bento pode lamentar é a Taça da Liga que Lucílio Baptista lhe tirou. Ah, e agradecer a Olegário Benquerença e Bruno Paixão algumas das taças que foi conquistando. Mas não interessa falar nisso, aí já houve mérito e as arbitragens foram exemplares.
Como seleccionador, a sua postura é a mesma. A de mártir inconsolável, incapaz de reconhecer que terceiros têm direito a criticar aquilo que faz, com o beneplácito da Federação Portuguesa de Futebol (FPF). E esta lamentável ocorrência no Gabão é tudo menos clubística. Aliás, pessoas de todos os quadrantes clubísticos entenderam que as declarações de Pinto da Costa têm toda a razão de ser.
Como resposta, Paulo Bento, num exercício kafkiano, deu umas respostas absurdas. E vem falar nos casos James e Jackson. Quer dizer, Paulo Bento insurge-se contra Pinto da Costa e não admite “ingerências” no seu trabalho, mas ele próprio pode lançar atoardas sobre a convocatória do seu par colombiano? Não estará a fazer uma ingerência ao seu trabalho? O que sabe Paulo Bento sobre os acordos que o FCPorto tem com os dirigentes colombianos? O que lhe interessa a convocação de James, Jackson, Danilo, ou Defour? Se a própria FPF não respeita os clubes que lhes cedem os jogadores, por que raio iria a Federação Colombiana se preocupar com isso?
Paulo Bento, esse coitadinho que é constrangido amiúde, não entende que é absurdo fazer uma viagem longa, a meio da semana, com uma temperatura e humidade impróprias e fazer rodar jogadores que vão jogar uma prova a eliminar 48 horas depois, em solo português. E já nem falo do facto de nenhum jogador do Benfica ter sido convocado e do lado do Sporting apenas Rui Patrício ter sido chamado, apesar de passar o jogo todo no banco. É melhor nem ir por aí.
O que Pinto da Costa quis dizer – e que Paulo Bento entendeu como uma “ingerência” no seu trabalho – é que tem de ser a própria FPF, pela mão do seleccionador português, a zelar pelo interesse de todo e qualquer jogo luso. E falou no caso específico de Moutinho e Varela porque, se calhar, é o patrão deles e é ele quem lhes paga o ordenado no final do mês. Deve ter pelo menos alguma legitimidade para falar.
Paulo Bento não percebe que são os clubes que sustentam os jogadores. São os clubes que de alguma forma emprestam os seus serviços às selecções, sem qualquer custo, correndo o risco de eles chegarem com mazelas físicas por actuarem num local inapropriado. E se Paulo Bento não admite que um patrão, que lhe fornece a matéria-prima numa bandeja de ouro, que custa milhões a cada mês, possa barafustar com a utilização indevida dos seus funcionários em circunstâncias nefastas, algo está mal.
Eu nunca quis que Paulo Bento fosse treinador do meu FCPorto. E muito se falou dessa possibilidade há uns meses. Depois destas declarações, só espero que Bento jamais pise o Estádio do Dragão como funcionário do meu clube. Paulo Bento provou uma vez mais que conseguiu sair do Sporting, embora o sportinguismo não o tenha abandonado nunca.
Nota 1: Parabéns, Estádio do Dragão. Foram 9 anos de momentos de alegria, de gritos histéricos, de incontáveis palavrões e de poucas tristezas. Fui aí muito feliz. Continua a proporcionar-nos estes momentos. Mas com um relvado decente, sim?
Nota 2: Nesta 9.ª jornada, Sporting evita empate com um golo absurdamente negligenciado ao Braga; Benfica vê-lhe ser perdoada uma expulsão clara no primeiro minuto e um penalty evidente de Matic sobre Braga, ao minuto 76. Benefícios que contribuíram decisivamente para o desfecho das partidas. Continuamos atentos…
Nota 3: Diz o comentarista Rui Gomes da Silva, na habitual tertúlia do Dia Seguinte, que “o poder sustentando e que tem mantido o Porto na liderança desportiva, em termos de resultados finais, (…) está a chegar a fim. Convençam-se de uma coisa: este tempo está a chegar ao fim”. Pois bem, daqui a quatro anos estaremos a confirmar isso mesmo.